Juízes e promotores defendem o fim do foro privilegiado
Representantes de associações de juízes e de promotores defenderam ontem, durante debate na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados, o fim do foro especial por prerrogativa de função. Para eles, essa medida se tornou um privilégio no Brasil e leva à impunidade de autoridades que cometem crimes.
Atualmente, autoridades – inclusive os juízes e promotores – acusados de crimes são julgados por tribunais superiores, em virtude do foro privilegiado. Deputados, senadores, o presidente da República e seus ministros, por exemplo, são julgados pelo Supremo Tribunal Federal (STF), enquanto governadores e autoridades estaduais são julgados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e os prefeitos, por tribunais de segunda instância.
A CCJ analisa diversas propostas que buscam acabar com o foro privilegiado O relator da matéria, deputado Efraim Filho (DEM-PB), defendeu que o tema seja votado logo pelo colegiado, com ênfase na discussão de como seria feita a extinção do benefício. “Os tribunais superiores, como o STF, deveriam ser uma instância recursal, e esse é o gargalo. Os juízes de primeira instância têm uma estrutura mais adequada para acelerar os processos e estão mais blindados de pressões políticas, que os de instâncias superiores”, argumentou.
Para a presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), Norma Angélica Reis Cardoso Cavalcanti, o fim do foro deve valer para todas as autoridades. “Nossa preocupação é que hoje surgem cada vez mais cargos com prerrogativa, porque nos estados isso fica a cargo das assembleias legislativas. Além disso, o poder de julgar não está sendo exercido pelos tribunais de forma adequada”, comentou.
Impunidade
Também favorável à extinção do benefício, o presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), João Ricardo dos Santos Costa, sustentou que o tempo de julgamento diretamente em tribunais superiores é muito grande, o que gera a sensação de impunidade. Ele explicou que na primeira instância, onde normalmente começam os processos criminais, um único juiz conduz a colheita de prova e os pedidos cautelares, o que dá mais agilidade ao trâmite. “Depois há recursos para tribunais superiores, mas a instrução é um momento muito importante desse processo e deve ser feita na primeira instância”, acrescentou.
Ajufe
Opinião semelhante tem o presidente da Associação dos Juízes Federais (Ajufe), Roberto Carvalho Veloso. Ele apontou que o foro especial tem sido uma via para a impunidade, porque os julgamentos demoram muito e os crimes acabam prescrevendo ao longo do processo. Atualmente, conforme dados da Ajufe, há 369 inquéritos em tramitação no STF, sendo 102 ações penais – outro levantamento, citou Veloso, indica que são necessários 617 dias para o recebimento de uma denúncia pelo tribunal. “Apesar das inovações do Supremo, o julgamento de autoridades não é a vocação primordial de um tribunal constitucional. Reverter essa demanda ,pode resultar em punição mais efetiva aos culpados”, afirmou.
Exceções
O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), José Robalinho Cavalcanti, também defendeu o fim do foro privilegiado, porém admitiu algumas exceções. Na avaliação dele, é aceitável uma ressalva como a do caso da França, para impedir que o presidente da República seja julgado por crimes alheios ao exercício da função, assim como outros chefes de poder e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
Da mesma forma, considera ele, pode haver uma salvaguarda para os parlamentares. A Casa legislativa em questão poderia, por exemplo, suspender um processo contra um de seus membros, a fim de evitar perseguições. “Mas isso só seria feito com anuência da maioria absoluta e sem a prescrição do crime, durante a suspensão da ação penal”, ponderou.
Oportunidade
O presidente da CCJ, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), destacou que este é o momento para refletir se vale a pena manter o foro privilegiado, pois o STF não consegue julgar os processos, apesar de ter se esforçado para acelerar os procedimentos. O Supremo, lembrou o parlamentar, criou a figura de juízes instrutores, que iniciam os processos e auxiliam os ministros, e também permitiu que as ações penais sejam julgadas pelas turmas, e não pelo plenário completo do tribunal. “Apesar disso, a Corte deixa a sua vocação de tribunal constitucional, para se ater a crimes que poderiam ser julgados por um juiz normal”, frisou.
Felizmente, esse subterfúgio usado largamente pelos corruptos de carreira para escaparem da punição para seus crimes, encaminha-se para a extinção.
Com Agência Câmara