Por “razão humanitária”, escolas se arriscam e deixam alunos levarem merenda para familiares com fome
Ontem (03), o g1 publicou uma matéria que bem reflete a situação caótica em que o país está jogado pela péssima e calamitosa situação promovida pelo governo federal, que atinge diretamente a grande maioria de famílias que não sabem mais para onde correr, para garantir o sustento diário aos seus membros.
De forma chocante, as famílias recorrem à merenda escolar distribuída aos filhos, por não terem condições financeiras para comprar até a alimentação básica.
Vergonhosamente, enquanto o Brasil possui um dos maiores rebanhos bovinos do mundo e uma expressiva produção de grãos, em contraste gritante aumenta a parcela de pessoas extremamente carentes, jogados à situação de miséria absoluta.
O relato de uma diretora de escola pública em São Paulo, traduz a situação de fome que virou rotina na maioria dos lares brasileiros: “A gente faz o que não pode fazer: chama as crianças fora do horário e dá merenda para elas levarem para casa. Às vezes, a própria família vem aqui pedir comida, como uma mãe que me disse: ‘o desespero me fez perder a vergonha — estou com fome’.”
Ela é um dos exemplos de profissionais da Educação que, em nome da razão humanitária, arriscam burlar as regras para ajudar pais de alunos em situação de vulnerabilidade.
Forma-se uma rede de apoio: merendeiras, professores, coordenadores e diretores pedagógicos detectam os casos mais críticos de famílias com insegurança alimentar e traçam uma estratégia de auxílio.
“Se alguém da cozinha vê uma criança pegando muita fruta e escondendo na mochila, a gente já sabe o que está acontecendo. No fim do dia, chama os pais e dá um pouco de comida”, diz a diretora, acrescentando que, “uma vez, um menino pegou tanta bolacha e guardou [na bolsa], que tivemos de chamá-lo na saída, discretamente. Explicamos que ele podia levar tudo para casa, mas que, quando precisasse, poderia pedir. Ele saiu pulando de alegria. Depois, montamos uma campanha de arrecadação”, conta.
Segundo especialistas ouvidos pelo g1, permitir que as merendas sejam consumidas pelas famílias é, em tese, uma prática irregular, porque o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) é voltado exclusivamente à nutrição dos estudantes.
Caso essa ajuda seja descoberta, a Secretaria de Educação, em teoria, pode ser responsabilizada pelos órgãos de controle por desviar recursos públicos para algo que não está entre as finalidades do PNAE.
“É claro que é complicado: os profissionais ouvem, em uma roda de conversa na sala de aula, que alguém está passando necessidade em casa, e aí querem resolver. Mas a merenda precisa ser consumida só pelos alunos matriculados, não existe autorização para os pais consumirem”, explica Marcia Simões, presidente do Conselho de Alimentação Escolar de São Paulo. “É uma verba que vem da Educação, para que as crianças se alimentem e tenham condição de aprender.”
Gabriel Corrêa, gerente de políticas educacionais da ONG Todos Pela Educação, também reforça que a distribuição de merenda para os familiares não é permitida, mas faz uma ressalva.
“É uma questão humanitária. Os educadores tentam achar uma solução temporária e imediata para apoiar as crianças. Quem trabalha na educação sabe: aluno não aprende nada de barriga vazia.”
Merenda serve de jantar e almoço
Na continuidade da matéria do g1, há o relato da mãe de dois alunos de uma escola municipal, da Região Norte do país, que conta que está desempregada e que sua única fonte de renda é o Auxílio Brasil (R$ 400), insuficiente para arcar com a alimentação de toda a família. “A diretora da escola onde minha filha estuda, é um anjo. Ela sabe quem está passando necessidade, e aí deixa a criança levar um pouco de merenda na mochila. Foi isso que me sustentou nos últimos dois meses. Graças a ela, tive almoço e jantar: mingau, canja, bolacha com suco.”
Em outro colégio público, na Região Sudeste, uma professora conta que, “acaba sobrando alimento em dia sem aluno, como quando tem conselho de classe ou evento na escola.
Nessas datas, o colégio chama extraoficialmente os pais dos jovens mais carentes para distribuir feijão, ovos, verduras, frutas e, às vezes, carne. É tudo bem escondidão e por baixo dos panos, porque, se o governo desconfiar, a gestão escolar pode ser advertida”, relata.
O que dizem as secretarias de Educação e os ministérios da Educação e da Cidadania
O g1 entrou em contato com todas as secretarias estaduais de Educação do país. Os órgãos do Acre, Roraima, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Pernambuco, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Distrito Federal afirmaram que desconhecem casos de colégios ou profissionais da Educação, que direcionem as merendas às famílias dos alunos.
Reforçaram também que os alimentos servidos nas escolas só pode ser consumidos pelos estudantes — e que casos de pais em situação de vulnerabilidade devem ser encaminhados para as secretarias/órgãos de assistência social.
Enquanto isso acontece, afora os casos já divulgados, como o dos “ossinhos” e “pele de galinha”, o Governo Federal e a Câmara dos Deputados “chafurdam” nas verbas do orçamento secreto 2022, estimado em quase R$ 17 bilhões, cujo maior beneficiário é o PL, partido de Jair Bolsonaro, que possui a maior bancada na Câmara, com 78 deputados.
Da Redação com g1